Como advogar na Irlanda

Uma das grandes questões de profissionais da área jurídica que vem para Irlanda, é se realmente tem como prosseguir suas carreiras jurídicas aqui ou não.

Para simplesmente entrar no mercado de trabalho e conseguir uma oportunidade na área, não é obrigatório fazer qualquer curso, ou prova. O background no Brasil (nisso incluindo qualificações e experiência) é considerado no recrutamento dessas vagas, e pela minha própria experiência e de outros colegas, vejo que na prática isso é possível.

É claro que qualquer especialização, curso ou conhecimento extra que você tiver, vai agregar no seu currículo e aumentar suas chances de contratação, mas isso não é obrigatório para conseguir um emprego na área jurídica.

Embora seja possível trabalhar na área jurídica sem se qualificar como advogado na Irlanda, quero clarificar como é possível sim um advogado brasileiro exercer a profissão aqui, como Solicitor (que é o termo utilizado na Irlanda para advogado). E para isso existem três rotas.

A primeira rota seria começar do zero. Como se a graduação no Brasil não valesse de nada e você precisasse reiniciar seu processo de qualificação.

Isso inclue primeiramente fazer um curso na Irlanda (não necessariamente de Direito, mas reconhecido pela Law Society para esse propósito), ou fazer um exame preliminar. Passada a etapa preliminar, você precisa prestar os exames FE-1s, que se assemelham ao nosso exame de ordem do Brasil, visto que inclue as mais abrangentes áreas do Direito, tais como, Direito Constitucional e Direito Criminal. Após passar nesses exames, você precisa fazer um curso prático chamado PCC (no qual você explora a parte processual do Direito), e, por último, você passa por uma fase de training por pelo menos 2 anos. Concluindo todas essas etapas, você pode finalmente aplicar para admissão no Rol de Solicitors e atuar como advogado (a) na Irlanda.

A segunda rota é atráves de um registro como advogado estrangeiro e isso requer que você já tenha uma qualificação na União Europeia.

Para nós brasileiros, o caminho mais prático é transferir o nosso título para Portugal. Isto porque, Brasil e Portugal tem um acordo de reciprocidade, o qual permite que nós (advogados brasileiros) nos inscrevamos na Ordem de Advogados de Portugal (OA) através de uma aplicação administrativa. Ou seja, sem necessidade de prestar nenhum exame ou de até mesmo residir lá.

Uma vez que você seja inscrito na OA, você pode se registrar junto a Law Society da Irlanda como Foreign Lawyer. Mas esse registro por si só não lhe dá o direito de atuar como advogado independente. Para que você possa ser admitido no Rol de Solicitors e exercer a profissão com autonomia, você precisará “exercer uma atividade na lei do Estado” ou uma “atividade profissional” por um período de três anos. Ao final, você precisará comprovar esse tempo de prática através de três referências de Solicitors qualificados na Irlanda que possam confirmar essa atividade. Feito isso, você pode finalmente aplicar para admissão no Rol de Solicitors e atuar como advogado (a) na Irlanda.

A terceira etapa, que ao meu ver seria a mais “rápida” e “menos complicada”, seria através da prova de transferência, chamada QLTT – Qualified Lawyers Transfer Test.

O meu processo de qualificação foi através dessa rota, e foi basicamente composto por quatro etapas: 1. Inscrição na Ordem dos Advogados de Portugal; 2. Aplicação para um Certificado de Elegibilidade junto a Law Society; 3. Aplicação e realização dos exames QLTT; 4. Aplicação para Admissão no Rol de Solicitors.

Conforme já brevemente explicado, a inscrição na OA é feita administrativamente. Isso inclui preparar um formulário, submeter documentos de suporte e pagar uma taxa de aplicação. Você pode submeter a aplicação toda por correio e a estimativa é de 60-90 dias para que a sua aplicação seja processada. Uma vez que você é registrado, você segue para a aplicação de um certificado de elegibilidade junto a Law Society.

O certificado de elegibilidade nada mais é do que uma declaração que confirma que você está apto a prestar os exames de transferência aqui na Irlanda. Para obter esse certificado, você precisa também preparar uma aplicação, submeter documentos de suporte e pagar uma taxa.

Entre os documentos requeridos, você precisará anexar uma certidão da OA, chamada “Certificate of Good Standing”, a qual atesta que você está regularmente inscrito na Ordem de Advogados de Portugal, está com as anuidades em dia, não tem nenhum processo disciplinar etc.

Além disso, você precisará apresentar três cartas de referências confirmando sua competência para prática. As cartas de referência podem ser um desafio. Isso porque, duas delas precisam ser feitas por advogados que atuem por pelo menos 5 anos (em Portugal ou na Irlanda) e que te conheçam há pelo menos 2 anos. Apenas uma das referências pode ser do seu atual empregador (ex. diretor, sócio ou gerente) e ele/ela não necessariamente precisa te conhecer por 2 anos. Referências de colegas não são aceitas.

A grande dificuldade desse requerimento, é que muitas vezes o aplicante ainda não teve nenhuma experiência profissional em Portugal e na Irlanda, e, portanto, não tem a quem pedir tais referências. Ás vezes você precisará atrasar um pouco seu processo até que realmente conheça esses advogados que poderão disponibilizar as cartas.

Tal certificado de elegibilidade é válido por três anos, ou seja, durante este tempo de validade você deve prestar todos os exames. Se por alguma razão não conseguir concluir tudo nesse período, você pode ainda renová-lo por mais três anos.

Uma vez que você obtem o seu certificado de elegibilidade, você pode finalmente aplicar para as provas de transferência.

O exame contém ao todo sete papers, sendo que a nossa qualificação em Portugal nos isenta automaticamente de uma das disciplinas (European Law). Á respeito de isenções, se porventura você já tiver uma experiência prévia (em Portugal ou na Irlanda), em quaisquer das áreas dos exames, você poderá pedir isenção e, se deferido o seu pedido, você não precisará realizar essas determinadas provas. Essa experiência é também comprovada atráves de cartas de referências dos seus antigos empregadores atestando seu contato com as matérias específicas.

Os sete papers são os seguintes: 1. Constitutional Law & Company Law OU Constitutional Law & Criminal Law, 2. Contract & Tort, 3. EU Law (somos isentos), 4. Land Law & Conveyancing, 5. Probate & Taxation, 6. Professional Conduct e 7. Solicitors Accounts.

A prova é toda discursiva (com exceção de “Professional Conduct” que é uma prova oral de 15 minutos) e é realizada duas vezes ao ano, normalmente Junho/Julho e Outubro/Novembro. A Law Society abre as aplicações com antecedência.

Depois de ser aprovado nas provas, você finalmente pode aplicar para ser admitido no Rol de Solicitors.

E essas são as três possíveis rotas para você se tornar um Advogado/Solicitor na Irlanda.

Embora pareça (e seja) um caminho árduo o qual requer muito esforço, dedicação e foco – eu posso dizer, com propriedade, que vale a pena. A advocacia na Irlanda é extremamente respeitada, bem estabelecida e altamente remunerada.

Além disso, tendo em vista que nós temos uma grande comunidade brasileira na Irlanda, existe a necessidade de mais advogados brasileiros que sejam qualificados aqui.

*NOTA GUIA DO FOL: Não nos responsabilizamos pelo conteúdo do texto, que é de inteira responsabilidade do autor/a(s). Importante destacar que as informações disponibilizadas no artigo não correspondem a uma consulta ou recomendação jurídica. Para uma orientação legal recomendamos que entre em contato com um advogado especializado.

Advogada Registrada no Brasil e na Irlanda
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